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TSE e política*


Por Fernando Molica em 03 de julho de 2023 | Comentários (0)

O julgamento de Jair Bolsonaro é uma boa oportunidade para se discutir a ação, a velocidade e os critérios da Justiça Eleitoral. A reunião do então presidente com os embaixadores ocorreu em 18 julho de 2022, há quase um ano, e a Ação de Investigação Eleitoral foi protocolada um mês depois.

Para os padrões da Justiça brasileira, o prazo de menos de onze meses é até curto, mas ficam dúvidas: a atitude de Bolsonaro justifica sua provável condenação, mas, já que foi algo assim tão grave, por que ele não foi punido à época, até impedido de disputar eleição? Será que ele teria sido declarado inelegível caso fosse reeleito? O TSE cassaria seu mandato?

Vale lembrar o julgamento da chapa Dilma Rousseff/Michel Temer, em junho de 2017, quase três anos depois da eleição de 2014. Por quatro votos a três, a acusação de abuso de poder político e econômico foi considerada improcedente — a decisão chegou a ser ironizada, dizia-se que a absolvição foi por excesso de provas.

Em meio a crises políticas e econômicas e ao arrastão da Lava Jato, o processo no TSE era visto como alternativa para o afastamento de Dilma da Presidência caso o impeachment não passasse. Mas, em caso de condenação, Temer seria despachado ao mesmo tempo. O julgamento só ocorreu nove meses depois que ela fora defenestrada, o que contribuiu para a suspeita de que a realidade política foi decisiva no resultado.

Caso não tivesse sido condenada pelo Senado e viesse a ser afastada pelo TSE, Dilma teria perdido o emprego um ano e seis meses antes de entregar a faixa presidencial, o que por si só ressalta a demora no julgamento. Faria lembrar o caso de Barbosa Lima Sobrinho que, em 1950, recebeu ordem da Justiça Eleitoral para deixar o governo de Pernambuco quando faltavam poucos dias para o fim de seu mandato.

O ministro Raul Araújo, que votou a favor de Bolsonaro, disse que a atitude do então presidente na reunião com embaixadores não foi capaz de influenciar de maneira decisiva o resultado do pleito (algo fácil de dizer diante da derrota). O mesmo argumento também foi utilizado em voto favorável à absolvição da chapa Bolsonaro-Hamilton Mourão, acusada de impulsionamento ilegal de mensagens em massa pelo WhatsApp na campanha.

Mas como definir se determinado comportamento — uso de fake news, financiamento ilegal, ações irregulares como as da Polícia Rodoviária Federal no segundo turno de 2022 — foi decisivo para o resultado eleitoral? Como medir a influência dessa ou daquela atitude no voto do eleitor? Melhor cumprir a lei, o que pode e o que não pode. O agora tolerante Araújo foi o mesmo que, ano passado, proibiu artistas de manifestarem sua preferência eleitoral em festival de música.

Com as devidas exceções, crimes eleitorais ocorrem à luz do dia, são cometidos durante a campanha, tanto que a Justiça Eleitoral têm ritos mais abreviados, pode agir de maneira célere. A questão é como e quando punir. A Justiça Eleitoral nem sempre acerta ao dedicidir entre o oito da quase impunidade e o oitenta de uma pena absoluta, como cassação de mandato ou decretação de inegibilidade.

Não é uma tarefa simples, mas é necessário aperfeiçoar a legislação e diminuir as margens de manobra e de subjetividade nas decisões. Uma justiça que lida diretamente com questões políticas não pode gerar tanta desconfiança em relação ao que faz.

*Correio da Manhã, 30/6/23.

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