WWW.FERNANDOMOLICA.COM.BR

Blog

PONTOS DE PARTIDA, O BLOG DO MOLICA

Risco público dos amigos privados


Por Fernando Molica em 02 de maio de 2012 | Comentários (0)

Coluna ‘Estação Carioca’, jornal O DIA, 02/5:

Não é fácil administrar amizades quando se exerce um cargo de poder. Vale para governantes, juízes, delegados de polícia, chefes de plantão em hospital, porteiros de boates e, mesmo, jornalistas. Todas estas pessoas — e muitas outras — têm, em determinados momentos, o poder de definir a sorte de outras: quem ganha e quem perde, quem entra e quem será barrado, quem tem o direito de ficar bem na foto.

Daí que fica complicado separar o amigo incondicional daquele que se torna amigo a partir de determinadas circunstâncias. Isto ocorre sempre numa operação de mão dupla, a velha história de mão que lava a outra. Afinal, vivemos num país em que até a máxima franciscana do “é dando que se recebe” virou desculpa para bandalheira, uma quase declaração de princípios para negócios escusos.

Não é simples definir até a que ponto se pode chegar, que presentes, convites ou carinhos devem ser aceitos. Temos a tradição das relações pessoais, do compadrio, do jeitinho, do quebra-galho. Muitas das pessoas que se dizem indignadas com políticos que nomeiam parentes são mais tolerantes quando um dos seus ganha um cargo de confiança numa repartição pública. No auge das denúncias contra seu governo, acusações relacionadas à atuação de PC Farias, primeiro-amigo e seu ex-tesoureiro de campanha, Fernando Collor foi à TV e disse que o presidente não tinha amigos. Não adiantou: os trabalhos da CPI revelaram a existência de uma teia que misturava contratos, tráfico de influência e tentativa de ocupação de lugares onde amigos de outros amigos estavam alojados havia muito tempo. No fim das contas, Collor e seus amigos acabaram defenestrados.

Ao ver sua amizade com o empresário Fernando Cavendish devassada por fotografias e vídeos, o governador Sérgio Cabral disse não misturar amizade com interesse público. Não surgiu nada que o desminta, mas é inegável o constrangimento causado pelas imagens; as cenas de amizade explícita entre o governador e o empreiteiro campeão de obras no estado alimentam suspeitas que não são boas para ninguém. O fato de as fotos terem sido feitas no exterior, em ambientes, em tese, preservados dos olhares de outros patrícios reforça a desconfiança de que algo ali não era para ser exposto. Insisto: não há nada de concreto que revele um favorecimento à Delta, mas, não tem jeito, o exercício de um cargo público exige alguns sacrifícios privados.

DEIXE SEU COMENTÁRIO

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *