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Apresentação teve “ensaio secreto” no domingo


Chega de saudade: depois de muitos anos – seis ou 15, as versões são conflitantes – João Gilberto e Tom Jobim voltaram a se encontrar no domingo. Nada de abraços e carinhos sem ter fim: sorrisos, um aperto de mão, um arrastado “Oi, Tom”. Na véspera, João e Tom haviam conversado por uma hora e meia por telefone.

O encontro foi às 18h30 na suíte do 12o. andar do hotel Caesar Park, em Ipanema, zona sul, onde João passou a semana que antecedeu ao show do Municipal. Acompanhado da mulher, Ana, Tom chegou às 18h20. João havia saído.

Ao chegar à suíte, Tom se decepciona ao ver o piano elétrico reservado para o ensaio. Calça branca, camisa larga branca e amarela, chapéu de palha, balança a cabeça ao tocar alguns acordes. “Não dá”, diz. Entre uma nota e outra, desiste de acender o charuto. “O João vai ficar zangado”, justifica.

Nisto, chega João. Cumprimenta Tom e Ana, lamenta a quebra da alça da caixa de seu violão e reclama do ar-condicionado. Preocupado com o show, João não dormia havia três dias – preocupação semelhante o fizera pedir, por três vezes, o adiamento da apresentação de anteontem, que estava prevista para agosto.

Ainda na suíte, João canta “Chega de Saudade”, que viria a abrir o bis no show. Decepcionado com o piano, Tom sugere que o ensaio seja em sua casa, o que é aceito por João. À espera do elevador, um silêncio constrangedor. Tom quebra o gelo: elogia a participação de João no comercial da Brahma e critica a “world music”. João concorda com um muxoxo.

No hall, Tom caminha na frente, João, de paletó cinza e tênis brancos, vai mais atrás, agarrado ao violão: passo tímido, quase caipira, pés um pouco virados para dentro. Atravessam o vidro da portaria do hotel e encaram, um ao lado do outro, a claridade de Ipanema. Vistos de costas, são personagens de uma não-realizada foto histórica: as duas silhuetas em contraluz emolduradas pelo mar de Ipanema.

O ensaio durou três horas. Anteontem, às 20h2o, eles voltaram a ensaiar no Municipal. Já havia uma certa cumplicidade. Tom cantava uma brincadeira com o nome do parceiro de palco: ” Viva o João Gilberto/ Viva o João do Prado/Vivia o João Gilberto Pereira de Oliveira.”

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