A arma que matou o cinegrafista
Por Fernando Molica em 10 de novembro de 2011 | Comentários (2)
Coluna Estação Carioca, jornal O DIA, 09/11
A morte do colega Gelson Domingos da Silva, repórter-cinematográfico da Band, levantou uma série de questionamentos sobre a segurança de jornalistas destacados para cobrir situações como a do tiroteio em Antares. Fala-se na necessidade de mais treinamento e na criação — por empresas jornalísticas, pelas entidades sindicais e pelos próprios repórteres — de limites mais claros para a exposição ao risco.
São pontos relevantes, que têm a ver com a lógica do nosso trabalho e com a importância de chegarmos o mais perto possível dos fatos. Não podemos abrir mão de cobrir qualquer assunto, assim como não devemos relaxar com a nossa segurança. Não é simples se chegar a um equilíbrio, mas isto não impede que este objetivo seja discutido e buscado.
Todas as considerações são importantes, mas é preciso que não nos esqueçamos do óbvio. Gelson foi morto por um tiro disparado por alguém que não poderia portar aquela arma, possivelmente um fuzil. Fuzis, assim como submetralhadoras, são armas de guerra cujo uso não deveria ter sido banalizado entre nós, elas não poderiam chegar às mãos dos bandidos. O acesso a armas de guerra é que permitiu a marginais do Rio estabelecerem um tipo de comércio de drogas original, baseado na conquista e domínio de territórios.
Chega a ser absurdo que, depois de incontáveis tragédias, bandidos tenham acesso a tantas armas e munição. Traficar armas é mais complicado que transportar drogas — não dá para levar uma AR-15 no estômago, o fluxo de munição precisa ser contínuo, exige uma uma azeitada rede de fornecedores. Ao contrário das drogas, armas e munição nascem legais, são fabricadas por empresas que têm endereço e CNPJ. Em tese, este tipo de tráfico seria mais fácil de ser controlado. Vale lembrar: praticamente toda a munição de armas pesadas, inclusive a usada por bandidos, é fabricada no Brasil.
Os marginais que proliferam em nossa cidade estão longe de ser integrantes de máfias internacionais, basta olhar para suas fotos nos jornais. Pobres, têm baixa instrução, são incapazes de ir ao Paraguai ou a Miami para negociar o fornecimento de armas. Estas chegam a até eles por mecanismos que passam, quase que de forma obrigatória, pela corrupção policial. A falta de um combate efetivo ao tráfico de armas e de munição revela a omissão de responsáveis pela área de segurança. Esta passividade permitiu a morte de Gelson e de tantas e tantas vítimas da nossa guerra particular.
Obrigado, Pablo. abs.
Fernando MolicaMolica: parabéns pela clareza e objetividade do artigo. Tal como se tratasse de uma legítima "tomada de câmera", ajusta a mirada da reflexão para um foco preciso da questão. Não obstante a imensa dor contida nesse triste episódio, não deixa de ser também uma bela homenagem ao colega! Abraços, Pablo
Pablo D. Fortes