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A desestatização das mentes


Por Fernando Molica em 15 de julho de 2013 | Comentários (0)

Coluna Estação Carioca, jornal O DIA, 26/6:

A recém-aberta temporada de manifestações públicas representa, talvez, a derradeira etapa da desestatização iniciada há mais de 20 anos, durante o governo Collor. Agora, a situação é diferente, estamos diante de um processo que, na prática, diminui o poder do Estado. Ao gritar que partidos políticos são desnecessários, parte da multidão reivindica o papel principal no jogo político, não quer ser mais figurante.

Ao revelar que não se sente representada pelos atuais políticos — eleitos por nós, vale frisar –, o povo da rua deixa clara a insatisfação com as instituições que, em tese, viabilizariam o exercício de nossa democracia. O pessoal erra ao fazer uma condenação genérica aos partidos: eles são necessários, fundamentais. Mas precisavam mesmo tomar um sacode para entender que existem para representar não os interesses de seus caciques, mas as diversas correntes de pensamento existentes na sociedade. Somos quase 200 milhões de pessoas, temos divergências entre nós, é bom que essas posições estejam presentes na briga política, no Congresso.

Ao rejeitar o atual modelo de representação, as ruas ajudam a quebrar nossa dependência em relação ao Estado. Até como uma espécie de herança das longas ditaduras, aprendemos a responsabilizar governos por nossos problemas. Uma postura confortável, que nos absolvia de muitos deveres. É como se não tivéssemos qualquer compromisso com nossa cidade, nosso estado ou país. Tudo era problema “deles”, dos políticos, só eles é que seriam incompetentes ou safados. Isto dava uma espécie de carta branca para transgressões: parar carro na calçada, dar grana para o PM, entrar pela janela no serviço público, não assinar a carteira da empregada, não fornecer nota fiscal.

Como diria Leonel Brizola, ao dar um não rotundo a tudo o que está aí, as passeatas apertam os políticos, mas também colocam o dedo nas feridas de cada manifestante. Ao propor uma refundação das instituições, a sociedade assume o compromisso de olhar para a própria cara. É hora de garantir uma participação mais efetiva e permanente, de delegar menos, de refletir sobre o que cada um pode fazer para melhorar uma sociedade tão injusta. Isto vale também para nós, jornalistas, ainda muito viciados na cobertura do poder institucional. Parte do poder mudou de mãos, está espalhado pelas ruas, é bom prestar mais atenção nesses novos protagonistas.

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