A gente não quer só medalha
Por Fernando Molica em 15 de agosto de 2012 | Comentários (0)
Coluna Estação Carioca, jornal O DIA, 15/8:
Ao fim de cada Olimpíada, após a contagem de nossas poucas medalhas, ouvimos os mesmos lamentos e promessas. Agora, o coro é maior, relacionado ao aumento de investimentos públicos nos esportes e ao fato de que os Jogos de 2016 serão no Rio. A gritaria acaba colaborando para o aprofundamento dos erros, o desperdício de mais dinheiro e a insistência num modelo equivocado de incentivo.
De um modo geral, países cujos atletas conquistam mais medalhas são aqueles que proporcionam melhor qualidade de vida aos seus cidadãos. Mesmo investimentos focados em atletas de elite, como foi feito pela Grã-Bretanha, têm como base uma estrutura pública de acesso à educação e ao esporte. A formação de campeões é consequência do bem-estar da população.
No Brasil, aplicações pesadas no esporte seguem a lógica de dar muito dinheiro para quem já é rico e de despachar migalhas para os pobres. Boa parte dos recursos da Lei de Incentivo ao Esporte é utilizada para viabilizar descontos no imposto de renda de empresas que promovem suas marcas em eventos esportivos. De quebra, a lei ajuda a encher os cofres de quem organiza as competições.
Isenções ficais bancam torneios de golfe e de pólo, campeonatos de rugby, olimpíada em colégio de elite, jogo de fim de ano de ex-atletas de futebol e até a formação, como piloto, nos Estados Unidos, de um neto do Emerson Fittipaldi. Entre 2008 e 2011, o governo deixou de arrecadar R$ 604,892 milhões em impostos em troca do patrocínio a práticas esportivas. Enquanto isso, pagou entre R$ 350 e R$ 1.500 mensais a beneficiados pelo Bolsa Atleta.
Ao entregar a empresas o direito de escolher onde aplicar recursos que são de todos, o País gera lucro fácil para alguns, reforça arcaicas entidades esportivas e deixa de priorizar atividades em escolas e em entidades públicas. Já as liberações emergenciais de dinheiro para atletas de elite funcionam como verbas anunciadas após catástrofes; quebram o galho, mas não mudam qualquer estrutura.
Não dá para adotarmos a lógica dos antigos países socialistas e passarmos a buscar medalhas a qualquer custo — não é isso que fará do Brasil um país melhor. Vale insistir: grandes atletas surgem naturalmente em sociedades que oferecem lazer, alimentação, cultura, habitação, emprego, saneamento e acesso à educação e ao esporte. Como diriam os Titãs, a gente não quer só medalha.