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A Islândia e sua torcida organizada demais


Por Fernando Molica em 05 de julho de 2016 | Comentários (2)

Pode parecer implicância – sou implicante, admito -, mas não consigo achar assim tão legal esta interação coreografada entre jogadores e torcedores islandeses.

Talvez por ter crescido sob uma ditadura, certamente por ter visto muitos filmes sobre o nazismo e a Segunda Guerra, fico sempre meio de pé atrás com essas grandiosas manifestações coletivas, ainda mais quando têm viés nacionalista, são motivadas pelo tal do orgulho nacional.

Mesmo quando era (ainda) mais jovem evitava bater palmas ou entoar “ôôôôô” ou besteira semelhante quando a adesão ao coletivo era estimulada pelo artista que estava no palco.

A seleção da Islândia bateu um bolão, mostrou um futebol alegre, objetivo, não teve medo de encarar os medalhões. Foi legal ver o entusiasmo de sua torcida – é até engraçado notar que dois terços da população do país caberiam no Maracanã, no primeiro e único Maracanã.

Mas esse negócio de palmas marcadas por tambor, de todos juntos vamos, de Pra Frente Islândia, de com islandês não há quem possa, de união nacional, de multidão regida por um líder – político, religioso, esportivo – desperta meus instintos mais primitivos e ameaça acender aquele aviso de perigo, perigo, perigo.

Situações semelhantes sempre dão margem para algum canalha achar que é hora de invadir a Polônia, de expulsar imigrantes, de matar a minoria da vez, de tentar recuperar na marra as Malvinas.

Prefiro as manifestações espontâneas, o choro do bêbado, o maluco que sobe a escadaria da Penha envolto na bandeira do seu time, o beijo roubado numa comemoração, o abraço no desconhecido (uma vez, no Engenhão, após um gol do Botafogo, abracei integrantes de um grupo que, percebi depois, era formado por pacientes de um hospital psiquiátrico. Como tudo ia bem, passei a abraçar os sujeitos a cada novo gol alvinegro – tava tudo regulando, caramba, não quebraria o ritual (admito que os caras saíram do estádio com a certeza de que o doido era eu).

Mesmo nos desfiles de escolas de samba fico meio assim-assim com alas de passo marcado, algo que contradiz a lógica do carnaval, da festa, da ausência de controles. Festa muito organizada não é festa. Todo mundo tem o sagrado direito de não querer fazer parte de uma multidão.

Nada contra os islandeses, longe de mim ver naquele simpático povo alguma tendência autoritária. Apenas não gosto de multidões organizadas. Resta torcer para que a seleção deles continue a brilhar, com o tempo os caras vão aprender a alegria de comemorar de forma menos organizada e mais espontânea.

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Comentários
06 de julho de 2016

Saudações, Eduardo. Sim, não havia segundas intenções na comemoração. Eu só acho esquisito, apenas isso. Abs.

Fernando Molica
05 de julho de 2016

Saudações. Lá na França, a Islândia viveu momentos históricos. Creio que a coreografia não teve um caráter político ou de "segundas intenções". Os aplausos ritmados com os braços abertos aos ares me pareceram muito mais a celebração por algo incrível do que qualquer outra coisa. Foi uma invasão "viking" sem visar conquistas territoriais, apenas enaltecer o esforço - na vitória ou na derrota - de uma seleção muito longe de qualquer favoritismo. No final das contas, sem querer querendo, a Islândia conquistou algo maior que a própria Euro: a simpatia do resto do mundo. Agora, seja como for a coreografia no futebol ou no carnaval, sempre será espontâneo o grito de gol e da nota 10. Há de ser! Abraços.

Eduardo