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As Medidas e os Mandamentos – muita calma nessa hora


Por Fernando Molica em 01 de dezembro de 2016 | Comentários (0)

É quase impossível buscar um pouco de calma no Brasil, mas não custa tentar. Ficamos tão radicais que entramos na lógica do 8 ou 80, do tudo ou nada, do bem e do mal. Não custa também dar uma lida nas propostas originais das 10 Medidas, no que foi retirado, no que foi aprovado. O mesmo vale para a responsabilização de juízes e integrantes do MP.

É claro que a maioria dos deputados favoráveis às mudanças no projeto das 10 Medidas, criado por integrantes do MP-PR, votou pensando em seus próprios interesses, mas algumas modificações foram corretas. Foram limados, ao longo da tramitação, o teste/pegadinha de honestidade, a validação de provas obtidas de forma ilícita, a remuneração de delatores, a limitação do habeas corpus.

Houve outras mudanças complicadas, que dificultam punições, e que precisam ser rediscutidas e reavaliadas – mas com calma, com cuidado. Como disse o Pierpaolo Bottini, professor de Direito da USP num debate recente, na FGV – o Deltan Dallagnol estava na mesa -, mudanças na legislação ocorridas em 2012 e 2013 já permitiram o aumento do combate à corrupção: ele frisou que a Lava Jato só é possível graças a essas alterações. A operação está sendo conduzida com a legislação em vigor, e não dá pra dizer que corruptos não estejam sendo punidos. A lei pode melhorar, mas também pode piorar; então, muita calma nessa hora.

A emenda que estabelece punições para promotores e juízes também peca pelo gosto da vigança, há questões muito subjetivas, é complicado provar que um integrante do MP ou um magistrado perseguir um determinado partido político. Mas a ideia de responsabilizar exageros é razoável, as funções, por mais nobres e importantes que sejam, são exercidas por seres humanos – e todos somos capazes de cometer vilanias, ninguém pode estar acima da lei. Ao proibir que juízes falem de processos em andamento, o projeto apenas prevê punição para algo que consta do Estatuto da Magistratura.

Talvez o principal erro tenha sido propor o pacote no meio da Lava Jato, no rastro do impeachment – isto, para pegar uma onda favorável à punição de corruptos. O fato de a proposta ter a assinatura de 2 milhões de brasileiros é importante, mas não definitivo – uma emenda constitucional para criar a pena de morte teria mais de cem milhões de assinaturas, uma outra favorável ao fechamento do Congresso Nacional também seria muito apoiada. O país tem quase 150 milhões de eleitores, não dá pra dizer que a maioria aprova as tais medidas, nem, principalmente, que a maioria aprova TODAS as medidas – Dez Medidas não podem ser confundidas com 10 Mandamentos, são criações humanas, não de Deus.

O mais prudente seria dar uma segurada na votação no Senado, deixar passar um pouco a pressa dos procuradores e o desespero de parlamentares que se sentem ameaçados. Eventuais mudanças na legislação não incidirão sobre crimes já cometidos, não terão qualquer influência nos casos que estão sendo apurados. Também não seria bom – e este parece ser o principal temor da Força Tarefa da Lava Jato – estabelecer punições para juízes e integrantes do MP que atuam em casos já abertos. Leis não podem ser feitas no calor dos acontecimentos, ainda mais num momento tão grave.

Não é bom também que MP/Judiciário e Congresso entrem em choque direto. Deputados e senadores, por piores que sejam, foram eleitos, têm uma legitimidade popular. E todos – procuradores, promotores, parlamentares – precisam ter cuidado para não aprofundar a crise institucional que estamos vivendo. A ameaça de procuradores da Força Tarefa de abandonar a Lava Jato só aumenta o Fla-Flu, joga lenha numa fogueira em que todo o país pode ser queimado.

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