Autoridades anônimas
Por Fernando Molica em 12 de abril de 2008 | Comentários (0)
Quem é jornalista sabe: volta e meia alguém – geralmente com mais de 70 anos – chega e diz: “Eu também sou jornalista!”. Para provar, o sujeito saca e exibe como arma uma carteirinha velha, amarelada e armafanhada de um tal Clube de Imprensa de São João da Barra. Isso se não tiver, plastificada, ali, bem à mão, uma cópia de artigo publicado no “Sentinela de Muriqui” que trata dos problemas causados pelo trânsito de charretes na cidade.
Esta profissão desperta em muita gente o direito de exercê-la. A internet e o número infindável de blogs só reforçam isso. O curioso é que agora até promotor público e uma juíza resolveram assumir também a função de editor de jornal, de decidir o que pode e o que não pode ser publicado. Os dois são de Águas de Lindóia, São Paulo, onde circula o semanário “Tribuna das Águas”. O jornal, pelo que li no ótimo site “Consultor Jurídico”, é o único da cidade e, portanto, cabe a ele publicar os atos oficiais da prefeitura.
O problema começou quando o promotor achou que o jornal estava elogiando demais o prefeito – e isso ofenderia o princípio da Constituição que impede que dinheiro oficial seja usado para fazer propaganda dos ocupantes de cargos públicos. Ou seja, a publicidade do governo federal não pode citar o nome do Lula, e assim por diante. Mas, para o promotor, o mesmo princípio deve ser adotado nas reportagens do semanário. Resultado, recorrreu à justiça, que determinou que o jornal não pode publicar nomes de autoridades.
Nunca li o “Tribuna das Águas”, nunca fui a Águas de Lindóia – acho esquisito viajar pra beber água. É até possível – não sei, repito, nunca li o jornal – que o semanário, como tantos e tantos veículos espalhados pelo país, principalmente fora dos grandes centros, viva principalmente de verbas oficiais e que seja simpático demais às autoridades que garantem seu sustento. Mas isso não justifica a atitude do promotor e da juíza. O “Tribuna das Águas” deve prestar contas aos leitores, que, de um modo geral, costumam rejeitar veículos subservientes aos poderosos. Com todo o respeito: ao se passarem por jornalistas, o promotor e a juíza acabaram virando censores.