Belo musical – apesar das músicas
Por Fernando Molica em 19 de abril de 2008 | Comentários (1)
“Apenas uma vez” é legal, sensível, delicado – confirma que é possível se fazer boa ficção a partir de histórias mais ou menos banais, que o recurso a grandes viradas – assaltos, homicídios, adultérios – serve, muitas vezes, apenas para esconder a incapacidade de se elaborar uma boa trama.
O diretor John Carney chega a brincar com alguns chavões cinematográficos. Fornece pistas que dão ao espectador a ilusão de saber o que vai acontecer na cena seguinte – os adivinhos quebram a cara. A falta de emoções fortes é a grande sacada de “Apenas uma vez” (“Once”, no original). O filme segue mais ou menos no ritmo da vida, essa que a gente leva no dia-a-dia: uma chateação crônica ali, desilusões que vamos empurrando com a barriga, a esperança ilusória de um novo e redentor amor.
A história do encontro entre um músico de rua (interpretado pelo roqueiro irlandês Glen Hansard) e uma imigrante (a também música Markéta Irglová) é simpática, conduzida com base em imagens ágeis – espertas, como se dizia há algum tempo – e cortes docemente abruptos. Tudo isso com o minúsculo orçamento de 150 mil dólares.
O filme é um musical não-convencional, os diálogos não são interrompidos para números de canto e dança. Mas a música é parte fundamental do longa – volta e meia os personagens aparecem cantando, dentro da ação. E o chato é ter que ouvir o tempo todo uma série de canções insuportavelmente açucaradas (diabéticos devem tomar doses extras de insulina antes da sessão). Uma delas, “Falling Slowly”, de Hansard e Markéta, ganhou o Oscar este ano – e é uma legítima representante daquelas gororobas melosas e retumbantes que costumam faturar o prêmio.
Vale o ingresso? Vale, claro. Mas saí do cinema torcendo para que “Apenas uma vez” não sirva de inspiração para um filme semelhante estrelado por Oswaldo Montenegro ou Fábio Junior.
Ôps, um comentário sobre "Apenas uma vez", feito por Sérgio Jones, acabou indo parar no post anterior - Resenhas. Como não sei mudar, ficou por lá mesmo. Vale a pena conferir.
Fernando Molica