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PONTOS DE PARTIDA, O BLOG DO MOLICA

Exportadores de gente


Por Fernando Molica em 14 de novembro de 2008 | Comentários (3)

Devo andar meio rabugento, é possível. Mas não consigo entender a festa em torno de histórias de jovens e mesmo crianças que são selecionados para treinar em times de futebol do exterior. A edição de hoje de “O Globo” traz mais uma dessas histórias – desta vez, a de um menino de 9 anos que foi cooptado (o verbo é meu) pelo Roma.

O menino, repito, tem 9 anos. Isso é lá hora pra ele ficar preocupado com carreira, salário, carrões? Desde quando um moleque de 9 anos tem que pensar se quer jogar na seleção brasileira ou na italiana? Imagina o tamanho da frustração do garoto se tudo der errado? Será que ninguém vê o tamanho da irresponsabilidade e da crueldade que é empurrar para esse menino o peso de construir um futuro próspero para ele e para sua família?

Claro que aos 9 anos até eu – um perna-de-pau assumido – sonhava em jogar no Botafogo, na seleção, o escambau. Mas era sonho, só isso. Se tivesse um mínimo de talento poderia até ter imaginado um futuro de jogador profissional, mas isso seria algo a ser construído ao longo dos anos, pertinho de casa, dos meus pais, parentes e amigos. Pegar um garoto de 9 anos e jogá-lo num clube como o Roma é, desde já, amarrá-lo a uma perspectiva de futuro desumana. Ele deve receber uma bolsa, um auxílio qualquer do Roma: isso é suficiente para caracterizar trabalho infantil.

Nem quero saber se o garoto vai perder características de jogador brasileiro. Fico preocupado é com ele e, de uma maneira mais ampla, com todos nós. Fico triste ao constatar que, 120 anos depois da Abolição, continuamos a comercializar gente. Antes, importávamos negros; agora, exportamos putas, jogadores de futebol e – caramba! – crianças. Estamos assumindo de vez que não vale a pena ficar, que este país é uma droga, que o último a sair é mulher do padre.

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Comentários
16 de novembro de 2008

Lamentável.

Diego Moreira
15 de novembro de 2008

Fernando, estamos todos rabugentos. Esse país precisa ser redescoberto ou reinventado urgentemente. Estamos vendo (os mais antigos ou experientes) os nossos valores irem pelos ralos. Todos nós, sociedade brasileira, principalmente nossos governantes, dirigentes, entidades, sempre ou em algum momento, querendo levar vantagem em alguma coisa ou algo. Infelizmente! Abraços,

Gil
14 de novembro de 2008

O mais irônico é saber que existe, sim, mulher do padre, aqui no Brasil. Vide o caso em Goiânia. No mais, tô contigo e não abro.

Rafael Rodrigues