Freio de arrumação na Lava Jato
Por Fernando Molica em 10 de março de 2016 | Comentários (0)
A desnecessária e mesmo abusiva maneira como Lula foi levado à Polícia Federal deveria servir como um alerta para o pessoal da Lava Jato. O episódio evidenciou excessos volta e meia cometidos na mais importante e ampla investigação sobre desvios de dinheiro público jamais realizada no país. Foi como aquele drible a mais que pune atacantes que, ao contrário do Fio Maravilha, não têm humildade na hora do gol.
A Lava Jato é tão fundamental que os responsáveis pela operação deveriam, até para preservá-la, aproveitar a deixa para acabar com rotinas que geram tantos questionamentos. A manutenção na cadeia, por prazo indefinido e antes do julgamento, de dezenas de réus, lembra a antiga prisão para averiguações. A lei deixa claro que prisões preventivas — e, segundo reportagem do DIA, 64 delas foram decretadas na Lava Jato — devem ser excepcionais, não podem servir para pressionar investigados.
A relação direta entre acordos de delação premiada e a libertação de presos permite admitir que a perspectiva de ficar meses a fio na cadeia tem sido o grande estimulador das colaborações. Uma lógica que, guardadas as necessárias proporções, remete aos tempos em que suspeitos eram pressionados a dar informações em troca do fim do suplício físico a que eram submetidos. O processo do Mensalão, que também teve como alvo políticos ligados ao governo petista, não recorreu a prisões preventivas — e não se pode dizer que tenha havido impunidade no caso. Mais: abusos no processo abrem espaço para futuras anulações, por tribunais superiores, de condenações decididas na primeira instância.
Seria importante também que as investigações não se limitassem aos crimes cometidos depois da chegada do PT ao Palácio do Planalto. É razoável supor que a roubalheira tenha aumentado nos últimos anos, mas seria risível dizer que, antes, empreiteiros e políticos se comportavam como freiras daquele convento visto da sede da Petrobras. E vale explicar por que, depois de tantos depoimentos e tantas buscas em empresas privadas, não foram encontradas e divulgadas pistas de malfeitos cometidos por governos estaduais.
Não dá pra achar que o toma lá-dá cá ocorreu apenas no âmbito federal e que o financiamento premiado de campanhas eleitorais tenha sido monopólio de um grupo político. Mesmo que esses outros crimes não sejam de competência da Justiça Federal, seria importante revelar o que foi descoberto — o silêncio representa um improvável atestado de honestidade a todos os governadores e prefeitos do país.
Estação Carioca, O DIA, 07/3.