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Funk de Rebeca marca rompimento com a conciliação brasileirinha


Por Fernando Molica em 03 de agosto de 2021 | Comentários (2)

O funk das apresentações de Rebeca Andrade no solo marca uma ruptura entre ela e sua mais óbvia antecessora, a também ginasta negra Daiane dos Santos.

Ao escolher ‘Brasileirinho’ para embalar e sustentar seus movimentos, Daiane optou pelo modelo de celebração nacional proposto pelo choro composto em 1947 por Waldir Azevedo e que, dois anos depois, receberia letra de Pereira da Costa. Uma trilha sonora que ainda parecia fazer sentido na primeira década do século 21.

Ao preferir ‘Baile de favela’, de MC João, funk carregado da linguagem dura e sexualizada que tanto marca o gênero (a letra tem versões hard e light), Rebeca rompeu com a conciliação proposta pelo choro que fala de um brasileiro entusiasmado, que abafa encanta e faz todo mundo dançar. O Brasil e o brasileiro não são mais os mesmos.

A dureza da quebrada tomou o lugar do aconchegante fundo de quintal. Como se, no Brasil de 2021, não houvesse mais espaço para um choro-exaltação que remete ao mulato inzoneiro citado em ‘Aquarela do Brasil’, de Ary Barroso. Não dá mais para botar o Rei Congo no Congado, a parada é outra.

A brasileirinha Daiane deu lugar à brasileiríssima Rebeca, a filha de empregada doméstica que exibe sorriso de porta-bandeira e a ginga sensual de uma passista.
Como disse uma professora da dança do samba, veterana da Portela, a uma de suas alunas que sonhava em brilhar na Avenida: “Faz cara de quem gosta”, ensinou, cheia de malícia. O conselho parece ter chegado a Rebeca.

Daiane era Nossa Senhora Aparecida. Como o manto da Padroeira, seu ‘Brasileirinho’ parecia tentar cobrir um país tão desigual. Ela bem que tentou, mas não deu certo, as injustiças e a violência falaram mais alto.

Rebeca é Iansã, senhora que faz ventar e trovejar, que encanta como uma tocata de Bach, que alegra, assusta e faz tremer como as festas de favela.

Com seus passos e saltos, a campeã olímpica ressalta os bailes de Helipa, Marconi, Eliza Maria, São Rafael. Lembra de um Brasil da favela, tão pouco venerado.
Nos chama pra dançar, nos alerta e anuncia que os tempos mudaram. Veio quente e botou pra ferver.

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Comentários
05 de outubro de 2021

Obrigado, Setti. Desculpe a demora, o blog estava com problemas. Abração.

Fernando Molica
03 de agosto de 2021

Caro Fernando, ótima pensata. Você deveria ter um esquema que permitisse a leitores colocar textos seus na web, começando pelo Twitter. Um grande abraço do Setti

Ricardo Setti