Leandro Resende
Por Fernando Molica em 02 de janeiro de 2022 | Comentários (0)
O querido camarada Leandro Resende escreveu esta resenha bem legal sobre ‘Elefantes no céu de Piedade’:
Tirei essa foto sob o céu do Largo São Francisco da Prainha e guardei para o momento em que, enfim, tivesse lido sobre o que havia no céu de Piedade a ponto de elefantes voarem por lá. Como lá e cá, à época dos fatos, como em todo o país hoje, imensos Dumbos serpenteiam pelo ar por mais que os ignoremos. Os mamíferos sobre nossas cabeças vem de uma piada mineira que meu compadre @fmolica ressignifica para situar seu romance na ditadura militar. A piada, ele explica no livro, também nos revela como permanecemos atônitos e coniventes diante do arbítrio, que é indiscreto como só poderiam ser os paquidermes suburbanos do meu parceiro.
O livro é um thriller, acelerado, em que toda a ação se constrói na tensão que há entre o novo morador do quartinho de empregada (e faz pensar na própria existência do local e do termo, o espaço onde fica o que tentamos ignorar) e a vida feliz de uma família de classe média, vascaína e contente com seu Opala dos tempos do milagre econômico. O morador é contestador e faz o personagem mais novo desconfiar que, afinal, havia algo estranho em Piedade e no país.
Mais não digo, porque o livro vai de uma tacada só. Há, ainda, uma singela reflexão sobre o lugar da memória nesses tempos bicudos, valeria o escrito só por ela.
O velho Marx diz que a história se repete, primeiro como tragédia, depois como farsa. Tem um sentido histórico aí que não me cabe, e gente mais capacitada do que eu sabe discutir os conceitos da frase no detalhe. Mas o que a vida brasileira tem mostrado é que se repete, sim, mas primeiro como tragédia, depois como prolongamento de uma mesma tragédia. Da nossa insistência em ignorar violências e violações variadas, imensas como elefantes no céu.
A história que Molica conta é excelente e, sobretudo, um alerta.