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O despertar do marimbondo


Por Fernando Molica em 30 de março de 2016 | Comentários (0)

Às vésperas de completar 86 anos, o ex-quase tudo até que dormiu bem, mas, ao despertar, sentiu-se desconfortável, como se não reconhecesse o próprio quarto. “Onde estou? Que cama é essa? Será que vim finalmente conhecer Macapá?”, perguntou para sua filha e herdeira política. Já desconfiada do que poderia ocorrer naquela manhã, ela resolvera passar a noite ao lado do pai.

“Não, pai, o senhor está na casa de sempre, e continua sem pôr os pés no Amapá, imagine se, depois de tanto tempo de vida pública, o senhor fosse obrigado a ir até aquele fim de mundo. Em matéria de lonjuras, já nos basta o Maranhão, onde estamos”, respondeu.

Ela não disse, mas sabia a razão da estranheza. O 30 de março de 2016 era um daqueles poucos dias na vida do pai em que ele não acordava abraçado ao poder – uma relação iniciada aos 25 anos de idade, quando assumira uma cadeira de deputado federal. Desde então estabelecera com governos e seus ocupantes uma relação absoluta, como seu corpo e sua mente tivessem sido incorporados às colunas dos palácios.

O desembarque ocorrido na véspera representava um daqueles poucos hiatos, recuo estratégico, momento em que o saltador vai ao fundo para potencializar o salto. Foi assim que fizera em 1984, quando, depois de servir à ditadura por quase 20 anos, decidira romper com os antigos aliados – uma reviravolta que o levaria à Presidência da República.

Aos poucos, o velho político se recompôs. Ainda na cama, tomou um gole de suco de mangaba, mordiscou o aipim cozido. Olhou para filha, acarinhou sua mão e decidiu entrar logo em atividade.

“Roseana, não posso me furtar às minhas responsabilidades. Ligue por favor pra todo mundo do partido, todos devem ter acordado muito mal também, alguns até nem devem ter dormido, nem o Michel, que armou essa confusão toda. Preciso lembrá-los de que isso não vai durar muito tempo. Daqui a pouco a gente está de volta”, sentenciou, enquanto esboçava um leve sorriso. O velho marimbondo não perdera o ferrão.

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