O novo Lulu das mulheres
Por Fernando Molica em 01 de dezembro de 2013 | Comentários (0)
Coluna Estação Carioca, jornal O DIA, 27 de novembro:
Soube que a moda dos últimos quinze minutos na internet é um aplicativo, um tal de Lulu, que dá às mulheres a possibilidade de divulgar o que pensam de determinados homens. O programa permite que elas nos deem notas, digam se somos assim, assado ou muito pelo contrário. Uma bolsa de valores em que vale apostar e blefar — duvido que sejam sinceras na hora de sair por aí alardeando qualidades de seus ex ou de eventuais futuros amantes.
Para algumas, trata-se de uma espécie de revanche das canalhices masculinas. Ou seja, assim elas apenas reproduzem uma atitude machista, demonstram querer se igualar aos manés que alardeiam suspostas conquistas em mesa de bar. Como alguém disse outro dia, esse negócio de julgar os outros é perigoso, costuma dizer mais sobre o avaliador do que sobre o avaliado.
O aplicativo, sintoma desses tempos de evasão de privacidade, parte do pressuposto errado, o da existência de um parâmetro, de um modelo de ser humano como aquela bailarina da música do Edu Lobo e do Chico Buarque, a que não tinha qualquer defeito. Besteira, o que nos enriquece não é a perfeição, são os limites que nos humanizam. Uma vez, me apresentei a uma moça de maneira quase suicida: botafoguense, recém-separado e pai de dois filhos. Por incrível que pareça, deu certo, ela deve ter ficado comovida com tamanha sinceridade.
Pecamos por ser míopes ou por enxergarmos até o que não deveríamos ver, somos baixos ou altos demais, sérios ou bobos, petistas, black blocs ou tucanos. Já bebemos demais, erramos feio no voto, acordamos em camas onde sequer deveríamos ter dormido. Mais de uma vez gritamos gol e a bola foi pra fora; aqui, ousamos em excesso, ali nos ferramos pela falta de coragem de mudar. Nossos defeitos e qualidades não são absolutos, não dependem apenas de nossa avaliação, são construídos e reconhecidos por nossos amigos, filhos, amantes e, mesmo, adversários — alguns destes nos dignificam. A régua que nos mede varia a cada momento, é capaz de mudar diante de uma nova história, o que soa terrível aos olhos de alguns será visto com muito carinho por outros. Mutantes, alternamos acertos e falhas e até mesmo a avaliação sobre atitudes pretéritas, o erro do passado pode, ao longo dos anos, se transformar em fonte de alívio e alegria. Tudo muda o tempo todo no mundo, como canta um outro e mais esperto Lulu.