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O risco de venezualização


Por Fernando Molica em 30 de abril de 2019 | Comentários (0)

Durante a campanha eleitoral falou-se muito em risco de venezualização do Brasil. Isto, numa óbvia referência à possibilidade de um novo governo de esquerda (de centro-esquerda, né?). Depois de passar uma semana em Caracas (muito pouco tempo, é evidente), arrisco dizer que a possibilidade de replicarmos a Venezuela existe, mas por conta da radicalização do processo político.

O que levou a Venezuela a esta crise não foi apenas a briga do chavismo com as forças conservadoras, mas, principalmente, a incapacidade de conversa e de convivência das diferentes visões. O chavismo faz parte do processo de radicalização, mas seria injusto não reconhecer que este movimento foi gerado pela intolerância de seus adversários. O chavismo golpeou, mas também foi vítima de golpes.

A injustiça, a violência política, o militarismo e a concentração de renda que marcam a sociedade venezuelana foram os fatores que permitiram a ascensão de Chávez. A radicalização que marcou seu governo é também fruto dessa histórica incapacidade de tolerância. O que há na Venezuela é uma ruptura do processo institucional gerado pela inviabilidade de convivência democrática, do respeito ao outro.

Brasileiros têm todo o direito de detestar o PT, assim como outros brasileiros têm o direito de defender os governos petistas. A questão fundamental é, porém, reconhecer a possibilidade e, mesmo, a necessidade da divergência. As manifestações de 2013/14, o impeachment, a prisão de Lula, o atentado a Bolsonaro, as incertezas geradas pelo Judiciário e as eleições radicalizaram todo o processo.

Empossado, o novo presidente brasileiro não fez qualquer esforço para esfriar os ânimos: ao contrário, joga o tempo todo no Fla-Flu, na demonização de quem se opõe a ele. É absurdo que um ministro da Educação decida cortar verbas de universidades acusadas de promover “balbúrdia” – um tipo de retaliação inconcebível na lógica republicana. E este é apenas o último exemplo de intolerância praticado pelo governo.

O risco de uma venezualização não tem a ver com o resultado eleitoral, mas com a proliferação de práticas não democráticas, com o crescimento da incapacidade de convivência, com a prática de tratar adversário como inimigo. É preciso baixar a bola, reconhecer que todos os brasileiros são livres para ter suas posições políticas e que todas são legítimas, desde que respeitem a existência do contraditório e da diversidade. Um presidente não é dono de um país, governa para aliados e adversários, todos somos cidadãos, todos pagamos impostos. E todos vamos nos ferrar se isso aqui virar Venezuela.

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