Os direitos de todos nós
Por Fernando Molica em 30 de junho de 2011 | Comentários (1)
Coluna Estação Carioca, jornal O Dia, 30/6
No Brasil, todos somos livres para exercer qualquer fé, para acreditar em qualquer deus. Mas somos também livres para não acreditar em nenhum deus. O País é oficialmente laico, algo fundamental para que possamos tocar nossas vidas em paz — quem acredita num deus tende a desconsiderar o deus alheio. Religiões costumam ter a lógica do certo e do errado; o Deus que salva é apenas aquele em que acreditamos; os outros não contam.
Daí a importância de garantir a cada um a liberdade de crença e, ao mesmo tempo, evitar que as convicções religiosas contaminem a vida civil, esta, baseada no confronto de ideias e da tolerância. Uma religião tem todo o direito de não promover, em seus templos, o casamento de homossexuais ou de divorciados. Mas seus fiéis não têm o direito de tentar limitar a cidadania de adultos que pagam seus impostos. O nome de nenhum deus pode ser usado como desculpa para a cassação de um direito. Para que nossos direitos — inclusive o que garante nossa liberdade de crença — sejam garantidos, temos que, mesmo que a contragosto, admitir os direitos alheios. Princípios religiosos, por mais corretos que sejam, não podem ser impostos a ninguém, muito menos a toda uma sociedade.
Semana passada, a Assembleia Legislativa analisou algo simples, uma emenda que incluía na Constituição estadual a garantia de que ninguém seria discriminado por sua orientação sexual — ou seja, da mesma forma que, no Rio de Janeiro, não podemos discriminar evangélicos, negros, umbandistas, judeus, árabes, comunistas ou deficientes físicos, não poderíamos discriminar homossexuais ou mesmo heterossexuais. Parece óbvio, não? Mas não foi. Líderes religiosos cerraram fileiras contra a proposta. A deputada católica Myrian Rios (PDT) chegou a associar homossexualidade a pedofilia — como se este crime não fosse também praticado por heterossexuais e por religiosos.
Não é o caso dela, mas é curioso: muitos políticos que tanto lutam por supostos valores religiosos e familiares não são tão enfáticos assim na defesa da lisura no trato do dinheiro público. Parecem usar a religião mais como escudo para seus atos, estes sim, danosos a todos, crentes ou ateus. O suborno, afinal, corrompe o coração (Eclesiastes 7:7).
Por último: o uso, na Parada Gay de São Paulo, de imagens inspiradas em santos católicos foi um misto de provocação e desrespeito.
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"O grande diferencial da democracia está no seu valor negativo: ela protege a divergência" Se as pessoas compreendessem isso, muito descalabro em nome da liberdade seria evitado.
Olga