Os grandes vencedores
Por Fernando Molica em 31 de agosto de 2016 | Comentários (0)
O grande vencedor de hoje não foi Michel Temer, quem faturou a medalha de ouro foram os integrantes da base de apoio do novo presidente da República. Nos próximos dois anos e três meses, Temer terá que cuidar muito bem daqueles que lhe entregaram a Presidência da República, políticos que, como a maioria dos colegas, costumam ser insaciáveis por cargos e diversas outras vantagens.
A manutenção, com o apoio de 12 senadores do PMDB, dos direitos políticos de Dilma, gerou uma crise no grupo que chegou ao poder e apontou uma espada na direção do pescoço de Temer. A lâmina que cortou a petista continua afiada, pronta pra fazer uma nova vítima. Deputados e senadores sabem que, agora, são os donos dos mandatos dos presidentes da República, eles têm força. Renan Calheiros fez questão de mostram quem está com a faca na mão.
A exceção aberta no caso Dilma abre também a possibilidade de uma absolvição parcial de Eduardo Cunha, o que complicaria o discurso de moralidade que ajudou a mobilizar milhões de brasileiros.
A vida promete ser dura para o novo presidente. Terá que rebolar muito para não ser atingido pelas diferentes balas disparadas na sua direção. Grupos econômicos e empresariais que apoiaram sua ascensão vão cobrar a implantação de medidas duras que enfrentarão muita resistência no Congresso.
Ao contrário de Temer, deputados e senadores voltarão a disputar eleições, alguns em outubro, quase todos em 2018. As generosas medidas anunciadas nos meses de interinidade foram um sinal de que ele não parece assim tão animado a segurar dinheiro. Dizem por aí que ele será contra o aumento dos ministros do STF, um reajuste que gera muitos impactos no funcionalismo. Será mesmo que ele, ameaçado de perder seu mandato no TSE, vai mesmo brigar com o Judiciário?
Pouco depois da concretização do impeachment, Aécio Neves já dizia que o apoio do PSDB a Temer seria mantido caso ele cumpra sua agenda econômica. Ou seja, já tem pronto o discurso para o desembarque do governo, o mesmo governo que seu partido tenta derrubar no TSE (tucanos são autores do processo que pede a cassação da chapa Dilma-Temer). O PSDB também não quer correr o risco de ver o PMDB renovar, em 2018, sua permanência no Planalto. A aliança tem prazo para acabar.
É preciso também ver como a população vai reagir a propostas como as de reformas da previdência e da legislação trabalhista e de desvinculação das aposentadorias do salário mínimo. Temer terá que encarar com firmeza mobilizações sindicais. Setembro é o mês de discussão de reajustes dos metalúrgicos do ABC e, em todo o país, dos petroleiros e dos bancários. Já há uma greve de bancários sendo articulada para a semana que vem.
A viagem à China servirá também para Temer avaliar como a comunidade internacional recebeu o impeachment de Dilma, medida muito criticada por importantes jornais da Europa e dos Estados Unidos. O presidente que fugiu das vaias no Maracanã e deu bolo no primeiro-ministro do Japão, terá, agora, que convencer líderes estrageiros da sua legimidade no cargo.
O novo presidente também enfrentará uma oposição que considera aviltada, atingida pela deposição de Dilma. O discurso da ex-presidente, que voltou a vestir vermelho, deixou claro que ela e o PT não aceitarão a derrota no Congresso. Não pretendem dar por encerrada a guerra iniciada pelo PSDB e pelo ex-aliado PMDB.
Ao cumprir todo o rito do impeachment, ao comparecer ao Senado e enfrentar mais de 12 horas de interrogatório, Dilma reforçou a imagem de lutadora, de vítima de uma injustiça. O PT perdeu a Presidência, mas pode exibir o discurso do golpe e tratará, até de 2018, de gritar Fora Temer. A ex-presidente não deixará de dizer que foi traída por aquele escolhido para ser seu vice. Ela pode, agora, ser o que nunca foi, uma líder política. Alguém que, ao contrário do seu sucessor, ainda tem o direito de concorrer a cargos eletivos.
A postura assumida por Temer durante o processo de impeachment complica qualquer tentativa de pacificação. Ele, ao contrário do Itamar Franco no caso Collor, conspirou de forma aberta pela derrubada de sua companheira de chapa. Vai ser difícil conseguir compromisso de paz com aqueles que, de maneira ostensiva, tratou de derrotar.
Ainda não acabou: de acordo com a ex-subprocuradora-geral da República, Temer está sendo delatado, envolvido por colaboradores da Justiça em denúncias de corrupção. Não apenas ele, mas muitos de seus aliados estão na mira da polícia, do MP e da Justiça. E não será bom se o novo presidente tentar, de alguma forma, atrapalhar as investigações.
O vice se mostrou competente na articulação da derrubada de Dilma, agora terá que mostrar capacidade de governar e de se equilibrar num poder que, agora, demonstrou toda a sua fragilidade.