Rio
Por Fernando Molica em 02 de outubro de 2009 | Comentários (5)
Faz tempo, muito tempo. Estava no Rio Grande do Sul e fui questionado por um colega gaúcho. Bomba de chimarrão em punho, ele acusou o Rio – não é exagero usar o verbo acusar – de não ter personalidade. De ser algo meio assim despersonalizado, sem cultura própria.
Tentei explicar para o sujeito que, pelo contrário, nossa lógica era outra. O melhor do Rio é a capacidade que temos de absorver e processar diferentes culturas. Tem a ver com o porto, com o fato de a cidade ter sido capital. O Rio aprendeu a se misturar: foi dessa mistura que saiu o que chamamos de música brasileira, fruto da interação entre pobres e ricos, negros e brancos. Do encontro virtual entre Cartola e Noel (branco, estudante de medicina). Essa mistura, produziu algo novo, diferente, específico e não excludente. Nossas escolas de samba cresceram porque foram incorporadas à lógica da cidade, não se tornaram guetos.
No Rio aprendemos a conviver com estrangeiros, a incorporá-los: Ruy Castro ensinou como judeus fugidos da Europa ajudaram a criar uma Ipanema libertária. Com meu pai – mineiro – aprendi que o Rio é generoso com quem vem de fora, de outros estados (os Quatro Mineiros – Paulo Mendes Campos, Sabino, Pelegrino e Otto Lara – se tornaram mais mineiros no Rio. E, por isso, se tornaram também cariocas). De alguma forma, o Rio sintetizou uma idéia de Brasil, virou referência, ponto em comum entre oiapoques e chuís.
Não adiantou muito: metido em bombachas virtuais, o cara insistia: falta de personalidade. Eu tentei conciliar: disse que o avanço das contradições, da violência e mesmo da barbárie ameaçava o que tínhamos de melhor, a tal capacidade de trabalhar tantas e tantas culturas. O que temia – e o temo – é o isolamento, não a mistura. Bem, o sujeito não se convenceu, o problema é dele.
Tudo isso é pra dizer que torço muito para que o Rio, coração-do-meu-Brasil, saia vitorioso na disputa pelo direito de sediar os Jogos Olímpicos de 2016. Apanhamos muito nos últimos 50 anos. Deixamos de ser a capital, fomos fundidos na ditadura. Perdemos, perdemos. Chegou a hora de recuperarmos, de faturarmos alguma recompensa. Vai ser bom pra todos, todos que somos cariocas – segundo o último censo, quase 200 milhões de brasileiros.
No final, Fernando, ganhamos todos mesmo. O ser humano aprende com os outros, e este mix de culturas que temos hoje, quem disse que não é outra também? Adaptada, "misturada", flexível, sempre na versão beta... Mas a vida não é mesmo sempre assim? Abs
Marcos WatanabeGanhamos, rapá! Vai ser legal! Abração, comemoremos!
Fernando MolicaEstou torcendo - e muito. Em nenhum momento hesitei. O argumento dos que torcem contra - haverá corrupção etc. - se esfarelam diante de uma só frase: se a gente não tem fé em melhorar, de que pode avançar, e por isso não faz nada, então é melhor fechar as portas do país.
Marcelo MoutinhoFalou tudo, Molica. Eu também, depois de muito hesitar, de uns dias para cá estou na sincera torcida - e as principais razões para isso são essas que você, muito bem, lista aqui. Abraço.
Eduardo CarvalhoTorço contigo e com todos os outros cariocas-brasileiros que desejam 2016.
Ana Cristina Melo