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Temer e o julgamento político de Dilma


Por Fernando Molica em 29 de julho de 2016 | Comentários (1)

Na entrevista de hoje a correspondentes estrangeiros, Michel Temer, segundo a Folha, disse o seguinte:

“Essa questão do impeachment no Senado não depende da nossa atuação. Depende da avaliação política -não uma avaliação jurídica- que o Senado está fazendo. Nós não temos e não poderíamos ter influência nesse processo”, afirmou.

E acrescentou: “Eu penso que o Senado vai avaliar as condições políticas de quem está hoje no exercício e de quem esteve no exercício da Presidência até um certo período.”
O problema é que, segundo a lei que regula o impeachment, a de número 1.079, de 1950 ( http://www2.camara.leg.br/…/lei-1079-10-abril-1950-363423-n… ), o processo é jurídico . O texto da própria lei diz que ela define “os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento.”

Em linhas gerais, a lei separa crimes comuns dos crimes de responsabilidade – estes,que podem gerar o impeachment, são claramente definidos:

“Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:
I – A existência da União;
II – O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados;
III – O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV – A segurança interna do país;
V – A probidade na administração;
VI – A lei orçamentária;
VII – A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos;
VIII – O cumprimento das decisões judiciárias (Constituição, artigo 89).”

Em nenhum momento a lei inclui entre os crimes de responsabilidade a eventual incompetência do governante. Também não diz que a falta de “condições políticas” (expressão usada por Temer) é também motivo para que um presidente seja posto para fora.

O que o Senado tem que julgar, no caso específico, é se a Dilma violou a lei orçamentária, um dos pontos capazes de gerar o impeachment.

A lei fala em julgamento, define claramente os papéis da Câmara, do Senado e do presidente do STF. Diz que o Senado é “tribunal de julgamento”.

“Art. 80. Nos crimes de responsabilidade do Presidente da República e dos Ministros de Estado, a Câmara dos Deputados é tribunal de pronúncia e o Senado Federal, tribunal de julgamento: nos crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Procurador Geral da República, o Senado Federal é, simultaneamente, tribunal de pronúncia e julgamento.

Parágrafo único. O Senado Federal, na apuração e julgamento dos crimes de responsabilidade funciona sob a presidência do Presidente do Supremo Tribunal, e só proferirá sentença condenatória pelo voto de dois terços dos seus membros.”

Ao dizer que o processo não é jurídico, mas político, Temer abre margem para a contestação da legalidade do processo de impeachment. Mais: ele pendura uma espada na direção do pescoço dos futuros presidentes, que terão seus mandatos ameaçados caso percam as tais “condições políticas”. Pendura uma espada na direção do próprio pescoço. O regime brasileiro não é parlamentarista, não custa lembrar.

A declaração de Temer transforma os próximos ocupantes do Planalto em reféns dos deputados e senadores. O presidente passará a ser um mero viabilizador dos desejos e interesses dos parlamentares.

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Comentários
30 de julho de 2016

Boa, Fernando! Mas o que me intriga não é toda essa farsa, mas o conformismo brasileiro com ela. Quem está no poder hoje é um grupo de gatunos, todos sabemos, mas é chocante a passividade que vivemos. Os gatunos saqueiam, mentem, violam direitos e nada acontece. Estamos sob o efeito de algo que não percebemos, Fernando?

Nonato Menezes